SECÇÃO: Opinião dos Leitores
Quem lhe deu a mão?
Na cidade de Chaves, que é olhada com orgulho e beleza por todos os flavienses, também existem fossos e muralhas que tentam esconder o que a sociedade ignora e não quer ver.
Em poucas linhas vai ser referido um caso concreto: é inútil negar que todos se lembram de um pobre homem sem-abrigo que vagueava pelas ruas, noite e dia, e que era conhecido por cantar num tom bastante agudo ou, como muitos afirmavam, por “andar aos berros pelas ruas a chatear e a tirar o sossego a toda a gente.
Perante isto, pergunto: não se está a falar de um ser humano? De uma pessoa que, na sua inocência e desgraça, vivia a vida como lhe era permitido e que se isolava no seu mundo sem perturbar ninguém? Mas, afinal, que desconforto e desassossego tão grande provocava ele nas pessoas que se afirmam como membros da sociedade comum? Seria por cantar? Ou berrar? Ou gritar? Ou por viver da forma que a vida lhe impôs? E se tanto incomodava e perturbava esta sociedade cruel e egoísta, porque razão ninguém o ajudou a sair desta vida, porque ninguém o ajudou a sair da rua? Muitos desconhecem que este homem até foi agredido por crianças que na sua liberdade de sair, uma noite, de madrugada, acharam que espancar um ser humano sem um tecto para se abrigar, era divertimento suficiente para “terminarem bem a noite”.
Apesar de ter sido ignorado, insultado, gozado, agredido e excluído, apesar de ter sido tratado como um “animal” abandonado, apesar de ter sido tratado como um fantasma, como se ninguém o visse e como se não existisse, teve a sorte de ainda existirem pessoas com coração e com vontade suficiente de ajudar a levantar aqueles que a vida deita ao chão.
Ao afirmar isto, estou-me a referir a uma instituição pública de Chaves onde, os funcionários e todos os membros que a constituem, tiveram o profissionalismo e a boa vontade, com base na igualdade social, na solidariedade e nos Direitos do Homem, nunca esquecendo o lado humano destes profissionais e o bom coração, mobilizaram todos os recursos possíveis e necessários para retirar este homem da rua e da sua vida de abandono.
A instituição referida é denominada por Centro de Saúde de Chaves N°1; que, reunindo os seus esforços e apelando à colaboração de todos atingiu o objectivo que se propôs.
Através da medida de Unidade de Apoios Integrados, que funciona conjugando os recursos do Centro de Saúde, da Segurança Social e da Santa Casa da Misericórdia, os profissionais desta instituição recorreram a todos os meios que tinham ao seu alcance para ajudar este ser humano que vivia como “um cachorro abandonado»; não por ele possuir qualquer tipo de documento que responsabilizasse o centro de saúde, mas pelo simples facto de este homem pernoitar principalmente na Madalena, cuja zona pertence à área de abrangência desta unidade de saúde.
É verídico que muitos, ou até mesmo todos, já acreditavam que este homem já não vagueia pelas ruas porque teria falecido.
O meu único objectivo, ao redigir este pequeno artigo) é dar a conhecer a verdadeira história deste homem e louvar os profissionais, as pessoas e a instituição que de tudo fez para dar uma vida digna a este ex-sem-abrigo.
Ao realizar esta boa acção, tanto os profissionais que dispensaram horas e horas do seu tempo a ajudá-lo, como a própria instituição, deu uma grande lição a todos os flavienses e à própria sociedade: comentar, criticar, passar, olhar e nada fazer, lamentar e ter pena é a parte mais fácil de uma história de desgraça e infelicidade; mas nem todas as pessoas têm coração e afecto suficiente para esticar o braço e dar a mão a quem mais precisa.
Por isso, antes de falarem, pensem; antes do dizerem o que deveria ser feito, façam; porque ninguém desta unidade de saúde falou ou disse o que tinha de ser feito, pensaram, agiram) fizeram e conseguiram. A união faz a força, e este é o exemplo mais concreto que eu conheço.
Mais uma vez, agradeço em nome deste homem, ao Centro de Saúde e a todos os seus profissionais incansáveis, o que fizeram e a ajuda que prestaram sem pedir nada em troca.
Neste momento, ele está bem de saúde, acolhido, alimentado e feliz. Este homem tem um nome que todos devem conhecer: Sr. Ricardo...
Leila Cristina Pinto
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