SECÇÃO: Opinião
Com-Posição
Autarquias a dar casas, o problema da “coisa”
O que agora, mais uma vez se prova, graças à boa imprensa, é que os bens públicos são usados, por quem detém o poder, de forma abusiva.
Na semana em que a Quercus recebe em Bragança, cedida pelo “Polis”, a sua sede, estalou o escândalo da entrega de casas em Lisboa com critérios mais que duvidosos.
O problema não é a cedência de casas para artistas poderem trabalhar, que se aceita e se deve promover a par de outros auxílios que não existem; é darem casa por cunha, por proximidade política, pelo critério do gosto, do favor, do compadrio. O que agora, mais uma vez se prova, graças à boa imprensa, é que os bens públicos são usados, por quem detém o poder, de forma abusiva. O mais grave é a naturalidade com que as forças políticas da capital encaram o problema, sintoma de que em Lisboa o bloco central de interesses é muito alargado; Lisboa tem mamas que dão para todos.
Dina Aguiar jornalista da TV e pintora nas horas vagas, inquilina da câmara nos ateliers dos Coruchéus, afirma que o problema desta sociedade é a dor de cotovelo e a inveja. Tem razão, partilha o espaço “como deixou claro verbalmente aquando do contrato” com a filha, formada em Belas-Artes; mete inveja aos pais que também têm filhos com a mesma formatura que são professores de desenho no secundário, ou pior, longe de poderem entrar “no meio” que a convivência dos Coruchéus proporciona. Eu tenho particular inveja da ve-readora da habitação da Câmara de Lisboa, Ana Sara Brito, que teve 20 anos casa do património camarário na rua do Salitre, e quando agora a deixou, pagava 150 euros menos um café. Por essa altura (20 anos mais ou menos coisa) a BBDO veio para Portugal e foram-me buscar a outra empresa para seu director de produção, na rua do Salitre. Nessa rua tive aulas no Instituto Italiano e era convidado da casa do Ribatejo, gosto do sítio e pagaria 150 euros e um cabaz de cafés para lá morar. Ir ecologicamente a pé para o trabalho, poupar 6.000 contos de juros que paguei à nacionalizada CGD para me emprestar um terço disso e viver num “bairro problemático” dos arredores. Com o dinheiro que não pagaria podia hoje comprar um híbrido para o fim-de--semana mais um jipe para ir fazer todo-o-terreno para um Parque Natural. Está justificada a minha dor de cotovelo. Há outros invejosos; jovens sem casa para constituir família e famílias à nora com a taxa Euribor, mas isso é tudo gente que não aprendeu a saber viver.
Os contornos políticos da rebaldaria que vai na Câmara de Lisboa (é só Lisboa?) são uma desgraça para os poderes sucessivos e também para as oposições, felizmente em tempo pré eleitoral. O facto de Ana Sara Brito ser da esquerda do PS e Alegre andar a ser namorado pela CDU e pelo Bloco, permitiu--lhe um tratamento condescendente pela esquerda que é eleita pelos “alfacinhas” apenas para suster os abusos do PS ou da direita. Isto na tese mais “inocente” que a outra é que também têm amigos envolvidos directamente. A esquerda não aprende que não há uma ética política para os camaradas e amigos, e outra para os restantes, perdem a oportunidade de fazerem a diferença. Se a vereadora fosse de direita estavam a pedir a sua demissão. O PCP não a quer demitida, e diz apenas que a “autoridade política da vereadora está danificada”, não especificando se a pane dá para continuar a andar como até aqui, se uma ida ao mecânico resolve o problema, ou vai acabar por ir de reboque para o centro de abate de veículos em fim de vida política. Para José Sá Fernandes (o do túnel do Marquês) eleito pelo Bloco de Esquerda com a palavra de ordem “O Zé faz Falta”, nem pensar em demissão, “foi uma coisa entre a vereadora e o engenheiro Abecassis”. Uma coisa diz o coiso, que já deixou o Bloco tão “danificado” que nas próximas autárquicas de Lisboa vai correr com o chassis no chão. Voto em Lisboa, mas só se concorrer um carro vassoura.
Há quem diga mal das sociedades por quotas e faça parte de sociedades por cunhas.
Em que autarquia se pode pôr um cartaz a anunciar, “zona libertada de sociedades de cunhas favores e companhia”?
2008-10-06
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